Escrito por: Thainá Duete

Agricultura familiar:a força que movimenta a enxada é a mesma que sustenta uma nação

No dia do(a) Trabalhador(a) Rural, a CUT Ceará destaca a luta e desafios de homens e mulheres que carregam nas mãos a responsabilidade de alimentar um país

Foto: Reprodução

O galo cantou e o sol nasceu! É hora de passar o café, colocar a enxada no ombro e ir para a roça. Neste 25 de maio, comemora-se o Dia do Trabalhador e da Trabalhadora Rural, e a CUT Ceará homenageia homens e mulheres protagonistas da luta em defesa da agricultura familiar, da agroecologia e da soberania alimentar.

A data foi criada pelo Decreto de Lei n° 4.338, em 1° de maio de 1964, em referência ao falecimento do deputado federal Fernando Ferrari. O líder político ganhou destaque por ser defensor dos direitos dos trabalhadores rurais e resultou na elaboração do Estatuto do Trabalhador Rural, sancionado pelo presidente João Gourlart em 1963, seguido pela promulgação do Estatuto da Terra no ano seguinte.

Não há dúvidas de que os agricultores são fundamentais para o Brasil. A agricultura familiar carrega nas mãos a responsabilidade de alimentar um dos setores mais importantes da economia brasileira e corresponde a números expressivos no abastecimento interno. 

De acordo com a pesquisa realizada em 2017 pelo Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a agricultura familiar é responsável por 70% dos alimentos consumidos em todo Brasil. O estudo ainda aponta que a atividade é a base da economia de 90% dos municípios brasileiros com até 20 mil habitantes. Além disso, é responsável pela renda de 40% da população economicamente ativa no país. 

Entretanto, a organização da classe trabalhadora do campo é mais do que apenas estatística de produção. Sua existência é um ato de resistência política alinhado às necessidades e expectativas de vida e tradições que vão passando de geração em geração. 

No Ceará, as entidades sindicais que representam e fortalecem a luta e a cultura da agricultura familiar são a Central Única dos Trabalhadores no Ceará (CUT-CE), a Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras no Estado do Ceará (Fetraece) e os sindicatos municipais.

Sindicalismo rurais e a CUT

Dos 5.059 delegados presentes na 1° Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat) em 1981, 1.658 eram trabalhadores do campo. A participação ativa dos trabalhadores rurais nos primeiros congressos da Central resultou em importantes pautas e resoluções de demandas que envolviam políticas agrícolas para o desenvolvimento agrário. 

A Conclat foi o encontro que originou a Central Única dos Trabalhadores (CUT) em 1983. Naquela época, a entidade somava-se às reivindicações dos agricultores pelos direitos trabalhistas da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), como a previdência, política salarial e econômica, combate à prática do trabalho análogo a escravidão no campo e maior fiscalização do Ministério Público. 

Para o secretário de administração da CUT-CE e representante da agricultura familiar, Emanuel Lima, a Central tem forte atuação na defesa de uma política agrícola, e sempre andou de mãos dadas com a luta dos trabalhadores e das trabalhadoras do campo. 

“A CUT é essencial para o fortalecimento da agricultura familiar, pois são as organizações sindicais que elevam as nossas pautas para o debate com a sociedade e aos poderes executivos. Somente a partir daí constrói-se políticas públicas e projetos que beneficiam a categoria”, explica o secretário. 

Emanuel ainda complementa que fortalecer a luta da agricultura familiar passa pela conquista de políticas públicas. “São essas lutas que resultam em projetos como por exemplo o da cisterna de placa que armazena água de beber, crédito para financiar a produção agrícola e o acompanhamento técnico”, aprofundou. 

Nessa mesma andança de luta, encontra-se outra entidade representativa do sindicalismo rural. Com seus 58 anos, a Fetraece vem organizando e fortalecendo as pautas da classe trabalhadora rural, é o que afirma o vice-presidente da entidade, Erinaldo Lima.

“Nós da FETRAECE, nesses 58 anos de trajetória, defendendo os interesses imediatos e históricos dos trabalhadores do campo agricultores e agricultoras familiares, destacamos que essa data simbólica tem um profundo significado para nós. O significado de dar destaque àqueles e aquelas que alimentam, de forma saudável, a nossa população”, afirmou.

Com o incentivo dos comitês de luta em defesa da classe trabalhadora, pela vida e democracia da CUT, a Fetraece lançou o Comitê Estadual de Luta da Agricultura Familiar com o objetivo de mobilizar a base em defesa de um país democrático e justo. De acordo com a direção da Federação, a meta é criar mais de 800 comitês de luta da agricultura familiar em todo o estado. 

“Precisamos de um campo vivo, com gente, com projetos, com políticas, e por isso compreendemos que defender a democracia brasileira é fundamental. Assim, lançamos o Comitê Popular da Agricultura Familiar e vamos juntos em cada município incentivar a criação de comitês que articulem o debate da democracia com as pautas da agricultura familiar”, complementa Erinaldo. 

Visibilidade às mulheres do campo

A história de organização e participação das mulheres trabalhadoras rurais como movimento social ganha contornos na década de 80. Contudo, a representatividade dessas trabalhadoras em atividades remuneradas ainda é baixa. Dentre os 4 milhões de trabalhadores empregados no campo em 2017 segundo o IBGE, apenas 477 mil eram mulheres.

Para a Central, é fundamental debater sobre a desigualdade no trabalho e a importância da representatividade e protagonismo feminino das trabalhadoras rurais nos sindicatos, é o que pontua a secretária da Mulher Trabalhadora da CUT-CE, Maria de Fátima.

“A participação da mulher trabalhadora rural no movimento sindical ainda precisa de avanços, seja na garantia de direitos à própria participação na ocupação dos cargos nos sindicatos. A luta das camponesas do campo também combate a invisibilidade dessas mulheres quando elas ocupam espaços de poder”, ressalta.

Mariinha mostra sua plantação de gergelim no município de Canindé-CE

Agroecologia é sinônimo de diversidade

O Brasil ainda é um dos maiores consumidores de veneno do mundo. Ao todo, o governo de Jair Bolsonaro (PL) liberou nos últimos três anos um total de 1.629 agrotóxicos. Uma média de 1,4 por dia, sendo eles proibidos em muitos países pelo alto risco à saúde humana e ao meio ambiente.

Em contraponto, o modelo sustentado pela agricultura familiar e por outros movimentos sociais que vivem da terra é o da agroecologia. Seu modelo corresponde à agricultura sustentável, sem o uso de agrotóxicos e que incorpora questões sociais, culturais, ambientais e éticas tendo como base o modelo familiar de produção agrícola.

E é do seu quintal produtivo que o jovem agricultor, Arthur Timbó, gera renda para a família e facilita o acesso à alimentos saudáveis e de qualidade dentro da comunidade Várzea da Curicaca, no município de Ipu, no norte do Ceará. 

O jovem Arthur apresenta sua pequena plantação de folhas no quintal de casa

“Eu sempre defendi a agricultura agroecológica por ser uma forma sustentável que não prejudica a terra. Aqui, eu, meu pai e minha mãe trabalhamos com o cheiro verde, alface, pimentinha, pimentão e estamos testando a produção de tomates. No final, tudo é vendido na comunidade.”, explica Arthur. 

Cabe ainda destacar que o manejo e a relação dos agricultores com a terra é a favor da diversidade do plantio, diferente da monocultura. É o que conta o agricultor aposentado de 77 anos, Pedro Mendes, do município de Tauá-CE.

O agricultor aposentado exibe a vagem do amendoim em desenvolvimento dentro do solo

“Eu planto em pequenas áreas e em conjunto. Por exemplo, eu planto o feijão junto com o milho, eu planto a manga junto com a goiaba. A plantação em consórcio ajuda na resistência solo. Dependendo da terra, cada um vai ter também o seu tipo de plantio mais adaptado àquela terra.”, ensina cuidadosamente.

Soberania Alimentar é um direito de todos!

Tá tudo caro? E a culpa é do Bolsonaro! O disparo da inflação, a escassez de alimentos e altos preços são resultados do desgoverno de Jair Bolsonaro (PL). A falta de uma política econômica fez com que a fome batesse na porta de quase 20 milhões de brasileiros.

Os números ainda apontam que 24,5 milhões não sabem quando será realizada a próxima refeição, é que mostra o levantamento da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan) de 2021.

Dentre os produtos que tiveram o maior aumento, os que mais chamaram a atenção dos consumidores foi a cenoura (+178%), tomate (+103%), abobrinha (+102,99%) e o café moído com (67,53%). É o que aponta o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do IBGE durante o mês de abril.

Mas se o Brasil é um grande produtor de alimentos, por que os preços estão elevados e milhões de pessoas passam fome no país? Programas destinados a subsidiar o seguro rural, o crédito agrícola e o apoio à comercialização sofreram severos cortes no Orçamento da União em 2021.

No texto final aprovado em março do mesmo ano pelo Congresso Nacional, a destinação orçamentária para o Plano Safra, inicialmente prevista em R$ 10,3 bilhões, sofreu um corte de 26% e caiu para R$ 7,55 bilhões.

Quando um governo não aplica recursos na agricultura familiar, o resultado que temos é um Brasil marcado por insegurança alimentar. O país deixou de ser dono do seu próprio nariz, deixou de ser soberano. Ter soberania alimentar é quando uma nação tem comida suficiente para nutrir os seus.

Por essa razão se faz fundamental que a sociedade esteja amplamente engajada na luta da agricultura familiar, uma vez que os problemas do campo sempre irão ecoar na cidade. Quando a falta de políticas públicas afeta o dia a dia do trabalhador do campo, o trabalhador da cidade não come.